domingo, 8 de maio de 2011

Minha mãe, nossas mães!


Minha mãe, nossas mães!



Ao voltar de minha caminhada vi o arco-íris. Senti-me emocionada. Faz tempo que não via um arco-íris.


Agradeci a Deus por ter a graça de sentir e ver essa beleza da natureza!


Ao mesmo tempo, procurei lembrar-me da última vez que o vi na minha cidade. Sim, eu vi no ano passado. Parece incrível, mas vi em Porto Alegre.


No mesmo instante, outra lembrança me veio à mente: minha mãe me chamando para ir até ao pátio da casa da praia para observar o arco-íris.


Naquele dia, ele se mostrava do lado de Torres até o mar. Lembro-me dele completo. E minha mãe chamava atenção que ele tinha todas as cores. Era uma festa para ela. Assim como ela adorava quando chovia e fazia sol. Sempre dizia: “Sol e chuva, casamento de viúva.”


Quantas lembranças se apoderaram de mim nestes dias de praia!


A saudade que sinto de minha mãe é um sentimento peculiar, sem sofrimento, sem tristezas, sem emoções duras revividas, somente recordações.


Cada canto desta casa tem o dedo dela.


Costumava dizer para não modificar nada enquanto estivesse viva, pois queria conservar tudo como meu pai tinha deixado. Como se as coisas fossem tão simples assim, como se nada precisasse de conservação; como se as mudanças não fossem necessárias para a manutenção, preservação e embelezamento.


As pessoas de mais idades têm dificuldades de aceitar as mudanças. Querem preservar tudo com medo da passagem do tempo, com receio da morte. E pensar que tem jovens que se sentem assim também.


Corro no tempo e me lembro de outras férias.


Do tempo em que acordava, lá pelas 9:30, e minha mãe já tinha lavado toda a roupa, sem máquinas..., estendido as mesmas, varrida a casa, tirado o pó, e deixada à mesa posta para meu café e das crianças. Sentia-se muito feliz! Ah, e ainda quando não já estava cozinhando feijão! Isso, eu não gostava. Aliás, detestava aquele cheiro de comida em pleno café da manhã! Tinha de me conformar, pois não adiantava falar nada. Naquela época se podia acordar tarde e ir à praia tarde, pois o sol não fazia tanto mal como agora.


E o mate na metade da tarde, com direito a sonho ou cuca de laranja feita em casa! Que delícia! Tinha todo um ritual! Ainda antes do mate, tinha outro ritual, depois da sesta, deliciar-se com uma melancia. Minha mãe adorava melancia, como eu! Não, não era cuca de laranja, o nome era pão de laranja. O pão feito em casa, mas com açúcar e cobertura de laranja, além dos pedaços de laranja dentro do pão. Deliciosas tardes! Comia-se sem culpas! Sem pensar em regime! Eram outros tempos!


Também ao caminhar perto das ondas do mar, veio-me novamente a imagem de minha mãe se banhando nas águas. Sempre se banhava. Dava seus pulinhos para se esquentar, se agachava, brincava como criança se molhando toda! Por mais fria que estivesse a água, dizia que estava muito boa! Falava, imitando meu pai, que o sal era bom para o corpo. Depois de se secar ao sol, caminhava na beira do mar. Quando não conseguia companhia, ia sozinha mesmo! Nada a impedia de fazer o que desejava!


Suas flores, já não existem mais na casa da praia, somente as árvores, mimos de vento, que tanto gostava!


Sim, lembro-me dela, mas sei que está bem onde estiver. Está com Deus! Acredito!


Pensar que em fevereiro completa um ano de sua morte!


Nos últimos anos de sua vida, nos dois últimos mais precisamente, a força de minha mãe foi colocada à prova! Junto com ela, minha capacidade de aceitar os fatos como se apresentavam.


Ver o Parkinson tomando conta de minha mãe não foi fácil! Antes disso, dessa doença que a dominava cada vez mais, a cegueira de um olho e 80% de outro que a fragilizou também.


Nossos pais voltam a ser crianças. Completamente dependentes. E, com mais necessidades de carinho, amor.


Infelizmente, temos dificuldades de dar todo o carinho de que eles precisam. Ofertar carinho às crianças é fácil, pois são engraçadinhas, queridas, com respostas imediatas aos nossos estímulos. Aos idosos, nos limitamos!


Trocar as fraldas dos bebês é um divertimento. Mesmo quando não param quietos com as pernas ou tenhamos que trocar pela segunda vez quase ao mesmo momento, pois aprontaram... Trocar as fraldas da mãe da gente não é nada agradável! O sentimento é inexplicável! Uma vez minha mãe me pediu para ir ao banheiro, estava sentada no pátio do lar onde vivia. Eu disse que ela poderia fazer xixi nas fraldas! Um dia esquecerei aquele olhar! Olhou-me furiosa e disse que não importava as fraldas, ela queria ir ao banheiro pois podia, não precisava das fraldas. Adorada mãe! Quanta dignidade!


Dignidade me fez lembrar de outro idoso. Um senhor que todos os dias leva seus dois cães para passear. Caminha com dificuldade, já usando uma bengala. Numa mão a bengala e noutra um saco plástico. Quando seus cães fazem as necessidades, ele se ajoelha e com a ponta de sua bengala, recolhe a sujeira dos cachorros, colocando no saco plástico. Depois, levanta com toda dificuldade! Isso eu chamo de cidadão! Respeito aos outros!


Tenho um enorme sentimento de compaixão com as pessoas idosas. Sempre penso nelas como um verdadeiro livro.


Cada uma com sua história. Se o final é feliz ou não, não importa. O mais importante é o tempo vivido entre o nascer e o morrer.


Em sua passagem por esta vida, tenho certeza que minha mãe foi feliz! Sei que não realizou todos os seus sonhos! Sua alegria de viver, suas amizades, suas realizações como comerciante e sua dedicação a todos, a fez imortal para os que conviveram com ela.


Ainda bem que somos ainda uma memória viva de nossos pais!


Lauria Beatriz Rodolf
Fevereiro 2009

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